
Categoria: Artigos
Data: 20/10/2023
O que as guerras nos ensinam?
Desde a Segunda Guerra Mundial, o planeta nunca viveu tantos conflitos armados como hoje. No total, 2 bilhões de seres humanos vivem em situações de guerra. Ou seja, a cada 4 pessoas no planeta, uma está envolvida diretamente em guerra! Isso sem contar a violência urbana dos latrocínios, sequestros e mortes violentas etc. que afetam a praticamente toda a humanidade.
De acordo com o Instituto para Economia e Paz, o ano de 2022 já havia sido o ano com o maior número de mortes em conflitos desde o genocídio em Ruanda, em 1994. Foram 238 mil, das quais 100 mil ocorreram na guerra no Leste da África, atingindo a região de Tigray. O segundo lugar foi da Ucrânia, com 83 mil. Conflitos estão cada vez mais internacionalizados, com 91 países envolvidos de alguma forma com situações de guerra ou confrontos no exterior. Em 2008, eram apenas 58 países nesta situação.
Se pensarmos em termos de custos materiais, em 2022, o custo da violência chegou a US$ 17,5 trilhões, 13% do PIB do planeta. Mais de R$ 10 mil por pessoa, em perdas. Para vergonha dos governantes e poderosos líderes dos países, o valor é suficiente para erradicar a pobreza e a fome! Porém, a indústria da guerra está em franco desenvolvimento, pois desde o final da Guerra Fria, nunca se gastou tanto em armas como hoje: mais de US$ 2,2 trilhões.
Consequentemente, nunca tantas crises humanitárias ocorreram de forma concomitantes, com a ONU solicitando US$ 55 bilhões para sair ao resgate de 250 milhões de pessoas. Nunca, desde 1945, tantas pessoas estiveram deslocadas ou refugiadas como agora: 110 milhões.
Haiti, Ucrânia, Iêmen, Síria e Israel/Palestina, além das tensões no Kosovo, Azerbaijão e tantos outros pontos do planeta mostram um mapa da incapacidade da comunidade internacional em estabelecer entendimentos. Não por acaso, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, tem insistido em suas reuniões: o mundo está em um ponto chave de sua história. Recentemente, ele se perguntou publicamente: “Quando foi a última vez que celebramos um acordo de paz no mundo?”
O alto comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, alertou que a situação "vai piorar", diante do colapso da diplomacia. Ele disse: “O mundo está cada vez mais dividido, fragmentado e voltado para dentro. Os políticos fomentam guerras culturais para dividir em "nós e eles”. O mundo de hoje - dividido como está - está menor do que nunca. A emergência climática, a pandemia da COVID-19 e os choques econômicos mostram isso. E, ainda assim, as conversas e as ações continuam a ser egoístas e míopes”
Bem, voltando ao ponto inicial, o que as guerras nos ensinam?
Primeiramente, que o problema é mais profundo do que os conflitos que dão manchete nos telejornais e sites na internet.
Não é apenas uma questão de limites da diplomacia, da prevalência de interesses geopolíticos e econômicos sobre valores humanitários. Tem a ver com a natureza humana decaída, que se revela incapaz de superar a maldade do pecado com a bondade para a qual cada ser humano foi originalmente criado.
Longe de ser reducionista e simplista, é do coração humano que sai toda guerra, seja no ambiente familiar com a violência doméstica, na briga de trânsito ou nos conflitos de exércitos e guerrilhas.
Quando Jesus foi questionado, em certo momento, sobre uma questão cerimonial – comer sem lavar as mãos – ele afirmou um princípio que, generalizado a tudo e a todos, explica de onde surgem os males humanos: “Raça de víboras, como podem vocês, que são maus, dizer coisas boas? Pois a boca fala do que está cheio o coração” (Mateus 12:34). Ora, não é apenas as palavras que revelam o coração mau do ser humano. É também suas atitudes deliberadas de fazer o mal, sua omissão em favorecê-lo ou sua conivência e responsabilidade em não combatê-lo.
E nem adianta colocar a culpa em Deus ou no diabo. Tiago, irmão de Jesus, adverte: “Ninguém, sendo tentado, diga: De Deus sou tentado; porque Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência. Depois, havendo a concupiscência concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte” (Tiago 1:13-15).
Em segundo lugar, se o ser humano tem sido individual e coletivamente incapaz de fazer a paz, então, a paz tem que vir pela transformação do ser humano promovida por quem o criou para a convivência harmonia: Deus.
Um dos nomes pelos quais Isaías apresenta Jesus, como o messias prometido, é “o príncipe da paz” (Isaías 9:6) e como fruto de seu reinado e domínio sobre a realidade humana, uma cultura de justiça perfeita e paz eterna será criada e mantida por seu principado nos corações e na nova sociedade. Que bela descrição:
“Então brotará um rebento do toco de Jessé, e das suas raízes um renovo frutificará. E repousará sobre ele o Espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor do Senhor. E deleitar-se-á no temor do Senhor; e não julgará segundo a vista dos seus olhos, nem decidirá segundo o ouvir dos seus ouvidos; mas julgará com justiça os pobres, e decidirá com eqüidade em defesa dos mansos da terra; e ferirá a terra com a vara de sua boca, e com o sopro dos seus lábios matará o ímpio. A justiça será o cinto dos seus lombos, e a fidelidade o cinto dos seus rins. Morará o lobo com o cordeiro, e o leopardo com o cabrito se deitará; e o bezerro, e o leão novo e o animal cevado viverão juntos; e um menino pequeno os conduzirá. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as suas crias juntas se deitarão; e o leão comerá palha como o boi. A criança de peito brincará sobre a toca da áspide, e a desmamada meterá a sua mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte; porque a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar”. (Isaías 11:1-9)
Eu consigo imaginar alguém retrucando à minha esperança na ação de Deus em transformar o ser humano, com os velhos argumentos que algumas das guerras mais cruentas foram justamente promovidas em nome dele, ou que alguns religiosos estão entre os mais belicosos.
Porém, para ser honesto é preciso separar aqueles que realmente tem sido alcançados pela graça de Deus e, mesmo em sua imperfeição, buscam a maturidade espiritual e existencial, amando a Deus acima de tudo e de todos, e ao próximo como a si mesmo. Que não se confunda rótulos religiosos com verdadeira espiritualidade!
Finalmente, há uma felicidade a ser experimentada por quem contribui aqui e agora para a paz. Nas famosas bem-aventuranças, Jesus ensina que “Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus” (Mateus 5:9)
Há uma ventura divina sobre aqueles que se tornam fazedores da paz em todos os níveis de suas vivências pessoais e atuações sociais. Eles se tornam filhos do Deus de toda paz, o qual nos convida à convivência perfeita com Ele e uns com os outros.
Certamente, as guerras como uma realidade global não acabarão com a simples decisão individual de fazer a paz e não haverá paz enquanto não houver justiça em todos os sentidos. Por isso, justiça e paz caminham juntos e o simples pacifismo não resolverá o problema da falta de justiça e de paz. A história tem demonstrado isso.
Porém, pelo menos ao redor de cada pacificador, é possível haver um microcosmo de compreensão, respeito e amor ao próximo a ser mantido, como um oásis em meio ao deserto. E é por oásis de paz que o ser humano sedento por paz tem procurado nos últimos tempos mais do que em qualquer outro momento da história.
Eu realmente acredito que a utopia cantada por John Lennon acontecerá a partir daquele dia em que o Príncipe da Paz reinar sobre os corações que o reconhecerem como Salvador e a ele se submeterem como Senhor:
Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz
Você pode dizer que eu sou um sonhador
Mas eu não sou o único
Espero que um dia você junte-se a nós
E o mundo será como um só.
Com carinho,
Rev. Dr. Robinson Grangeiro Monteiro
Chanceler do Mackenzie